Uma alma verdadeiramente católica deve exultar ao tomar conhecimento de dons especialíssimos concedidos por Deus a nossa Mãe celeste.
Um dos temas que mais atrai a ira dos protestantes é a devoção devida a Nossa Senhora. Incompreensões e calúnias de todo género circulam a esse propósito.
Discutindo com protestantes, acabei por constatar que, na raiz dessa posição, está sempre presente o orgulho. E este vício manifesta-se num ponto fundamental: o igualitarismo. Para uma pessoa orgulhosa, tudo aquilo que o outro possui, e ele não, é considerado um rebaixamento. Segundo tal mentalidade, para se evitar isso dever-se-iam suprimir todas as desigualdades. Aceitar-se-ia, quando muito, Deus como único ser diferente, mas nada de santos e criaturas privilegiadas.
Essa é uma mentalidade anti-católica. Para uma pessoa de mentalidade católica, o facto de outro possuir algo que ela não tem não representa uma afronta, não constitui uma agressão. Mas, pelo contrário, sentimo-nos felizes reconhecendo e amando a hierarquia estabelecida por Deus.
Arquitectura da Criação
Dito isto, compreende-se que um católico, quanto mais conheça privilégios de Nossa Senhora, sinta-se especialmente comprazido. E, realmente, Deus Nosso Senhor cumulou-A com uma série de privilégios altíssimos. O que é perfeitamente arquitectónico no plano da criação.
O primeiro privilégio, do qual decorrem muitos outros, é a Imaculada Conceição, mediante a qual Nossa Senhora foi preservada do pecado original. Convinha que a Mãe de Deus fosse isenta de qualquer mancha de pecado.
Desse privilégio decorre a ausência da inclinação para praticar o mal. A Mãe de Deus não experimentava nenhuma das más inclinações que podem levar ao pecado, e, graças à sua fidelidade, não cometeu a mínima imperfeição.
Igualmente — e este é o terceiro privilégio — Nossa Senhora teve um parto miraculoso e sem dor. Quando Adão e Eva pecaram, Deus disse a Eva: “Darás à luz com dor os filhos” (Gen 3, 16). Sendo Nossa Senhora isenta do pecado original, compreende-se que o parto d'Ela não pagasse tributo à dor. O que é explicável, pois não convinha que a vinda do Salvador — alegria do Universo — ocorresse em meio à dor, mas sim numa atmosfera de júbilo.
Um quinto privilégio: o seu corpo não se corrompeu no túmulo. A perda da vida acarreta a destruição da matéria, mas no caso d'Ela a morte não teve poder sobre a matéria. Nada se alterou, nada se perdeu. Por isso a sua morte é comparada ao sono, à Dormição.
O quarto privilégio foi a sua santa morte. A morte é fruto do pecado original. Disse Deus a Adão: “Tu és pó e em pó te hás de tornar” (Gen 3, 19). Como a Virgem Santíssima foi concebida sem pecado original, não havia razão para Ela morrer. Poderia ir directamente para o Céu, sem passar pela morte. Entretanto, Nossa Senhora desejou não ficar isenta dessa provação, pela qual até seu Divino Filho tinha passado. Por isso faleceu, mas de morte tão suave que, na linguagem católica, fala-se em Dormição da Beatíssima Virgem Maria. A sua morte não foi causada por doença ou velhice. Dominava-a tal amor de Deus, que Ela morreu mais propriamente devido a esse amor.
Obra-prima da Criação
Um sexto privilégio é a plenitude das graças recebidas. Deus é grandioso, generoso, porquanto cria sem nenhuma necessidade de criar, fazendo-o porque assim o quer. E, ao criar, Deus decidiu que ao menos uma mera criatura recebesse tudo o que é possível a um ente criado receber. Assim, recebeu Ela já no primeiro instante do seu ser todas as graças possíveis.
Então, manifesta-se um sétimo privilégio. Em tese, seria possível Ela a receber e rejeitar. Mas Nossa Senhora foi inteiramente fiel à graça, que A preservou de toda imperfeição.
Um oitavo privilégio foi a maternidade divina. Deus é a Sabedoria, e tudo o que faz decorre de uma razão altíssima. Qual seria o sentido de existir uma criatura a mais perfeita possível, isenta do pecado original e cheia de graça, e não lhe tocar uma vocação superior? Seria como uma obra de arte que não fosse exposta ao público e permanecesse fechada num cofre. Nossa Senhora é a obra-prima da criação, sendo lógico, portanto, que recebesse uma vocação proporcional à sua especialíssima situação. E que vocação pode haver mais alta do que a de ser Mãe de Deus?
Maternidade e virgindade
Tratemos de um nono privilégio. Deus quis que a Sua Mãe fosse Virgem. Por quê? Não é regra comum da vida que maternidade e virgindade sejam incompatíveis? A virgindade não é apenas algo físico, mas corresponde também a um estado de alma. Quis Deus que as mães votem um amor especial, do ponto de vista natural, pelos seres que geraram. Mas para Nossa Senhora Ele almejava mais. Ela devia ser dotada de todo o amor possível de Mãe, mas concomitantemente, de todo o desapego das coisas do mundo que a virgindade produz nas almas. E, Nossa Senhora, a mais perfeita das mães, devia ter alma de Virgem, a fim de fazer o mais perfeito sacrifício possível e praticar o supremo desapego: entregar seu próprio Filho para ser imolado, com vista a redimir nossos pecados.
Um décimo privilégio de Nossa Senhora: Assunção aos Céus, em corpo e alma. Compreende-se igualmente que, segundo o plano divino, um ser tão perfeito deveria receber um prémio perfeito. Em contraste com os outros seres mortais, Ela está no Céu em corpo e alma.
Dispensadora das graças
Tendo-a chamado a Si, de forma tão privilegiada, compreende-se que Deus A tenha coroado como Rainha do Céu e da Terra. Este é o décimo-primeiro privilégio.
Finalmente, o décimo-segundo: a omnipotência que Jesus Cristo lhe concedeu, estabelecendo-A como dispensadora de todas as graças. Tal privilégio, altíssimo sem dúvida alguma, é também um extraordinário prémio para todos nós. Afinal, quem se beneficia dele? Nossa Senhora recebe todas as graças para as distribuir aos outros. Ela é a dispensadora, Aquela que entrega.
Voltamos ao início do artigo. Poderia alguém, com espírito de fé, lamentar tais privilégios? Posso eu sentir-me diminuído pelo facto de ser Ela a dispensadora de todas as graças? Como não ficar jubiloso ao saber que tão perfeita Mãe dispõe do poder de espargir entre os seus filhos as graças divinas? Peçamos então o poderoso auxílio d'Ela. E rezemos pela conversão daqueles a quem o orgulho cega, não querendo entender a beleza de uma Mãe tão cheia de privilégios, que a todos eleva.
Valdis Grinsteins in catolicismo.com.br
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