Visão sobre a Apostasia na Igreja (...), era o número imenso daqueles que maltrataram de muitíssimos modos a Jesus Cristo, seu Redentor, real e substancialmente presente no Santíssimo Sacramento, com divindade e humanidade, com corpo e alma, com carne e sangue, debaixo das espécies de pão e vinho. Avistei entre esses inimigos de Jesus todas as espécies de profanadores do Santíssimo Sacramento, penhor vivo de Sua contínua presença pessoal na Igreja Católica. Vi com horror todos esses ultrajes, desde o descuido, irreverência, abandono, até o desprezo, abuso e sacrilégios os mais horrorosos, o culto dos ídolos deste mundo, orgulho e falsa ciência e por outro lado, heresia e descrença, fanatismo, ódio e sangrenta perseguição. Vi entre esses inimigos de Jesus todas as espécies de homens: até cegos e aleijados, surdos e mudos e mesmo crianças; cegos, que não queriam ver a verdade; coxos, que por preguiça não queriam segui-l'O; surdos, que não queriam ouvir-Lhe as exortações e advertências; mudos, que não queriam lutar por Ele nem com a palavra; crianças, desviadas na companhia dos pais e mestres mundanos e esquecidos de Deus, nutridos pela concupiscência, ébrias de ciência falsa, sem gosto das coisas divinas ou já perdidas por falta delas, para sempre.Todas essas ofensas feitas a Jesus no SS. Sacramento, vi-as aumentadas por numerosos reitores das Igrejas, que não tinham esse sentimento de justiça de repartir pelo menos o que possuíam com o Salvador, presente sobre o Altar, que se entregou por eles à morte e se lhes deu todo inteiro no SS. Sacramento. Em verdade, mesmo os mais pobres estavam muitas vezes melhor instalados nas suas casas do que o Senhor nas Igrejas. Ai! Como esta falta de hospitalidade entristecia Jesus, que se lhes tinha dado como alimento espiritual! Pois não é preciso ser rico para hospedar aquele que recompensa ao cêntuplo o copo de água oferecido a quem tem sede. Oh! Quanta sede tem Ele de nós! Não terá acaso motivo de queixar-se de nós, se o copo estiver sujo e a água também? Por tais negligências vi os fracos escandalizados, o SS. Sacramento profanado, as Igrejas abandonadas, os sacerdotes desprezados e em pouco tempo passou essa negligência também às almas dos fiéis daquelas paróquias: não guardavam mais puro o tabernáculo do coração, para receber nele o Deus vivo, do que o tabernáculo dos altares. Para agradar e adular os príncipes e grandes deste mundo, para satisfazer-lhes os caprichos e desejos mundanos, vi tais administradores de Igrejas fazer todos os esforços e sacrifícios; mas o Rei do Céu e da Terra estava deitado, como o pobre Lázaro, diante da porta, desejando em vão as migalhas de caridade que ninguém lhe dava. Tinha apenas as chagas que nós lhe fizemos e que lhe lambiam os cães, isto é, os pecadores reincidentes, que, semelhantes a cães, vomitam e depois voltam para comer o vômito.Ah! Ele os seguia com olhares tão tristes, lastimando-lhes a perdição. Ele, que no SS. Sacramento se nos tinha dado como alimento, para unir ao corpo da Igreja, sua Esposa, os homens separados e dispersos, viu-se despedaçado e dividido nesse mesmo corpo de sua Esposa, pelos maus frutos da árvore da discórdia. A mesa da união no SS. Sacramento, sua mais sublime obra de amor, na qual quis ficar eternamente com os homens, tornara-se, pela malícia dos falsos doutores, fonte de separação. No lugar mais conveniente e salutar para união de muitos, na mesa sagrada, onde o próprio Deus vivo é o alimento das almas, deviam os seus filhos separar-se dos infiéis e hereges, para não se tornarem réus de pecado alheio. Viu que deste modo povos inteiros se Lhe arrancaram do coração, privando-se do tesouro de todas as graças, que Ele deixara à Igreja. Era horrível vê-los separarem-se, só poucos no princípio, mas esses se voltaram como povos grandes, em hostilidade uns contra os outros, por estarem separados no Santíssimo. Por fim vi todos que estavam separados da Igreja, embrutecidos e enfurecidos, em descrença, superstição, heresia, orgulho e falsa filosofia mundana, unidos em grandes exércitos, atacando e devastando a Igreja e no meio deles, a serpente, instigando e estrangulando-os. Ai! Era como se Jesus se visse e sentisse despedaçado em inúmeras fibras, das mais delicadas. O Senhor viu e sentiu nessas angústias toda a árvore venenosa do cisma, com todos os respectivos ramos e frutos, que continuam a dividir-se até o fim do mundo, quando o trigo será recolhido ao celeiro e a palha será lançada ao fogo.Entre as crianças, cujo aspecto me afligiu particularmente, porque Jesus amava tanto as crianças, vi também muitos meninos ajudantes da Santa Missa, pouco instruídos, mal educados e desrespeitosos, que nem respeitavam a Jesus Cristo na mais santa cerimonia. Em parte eram culpados os mestres e os reitores das Igrejas. Vi com espanto que também muitos sacerdotes, de todas as hierarquias contribuíam para o desrespeito de Jesus no Santíssimo Sacramento, até alguns que se tinham por crentes e piedosos. Quero mencionar, entre estes infelizes, apenas uma classe: vi ali muitos que acreditavam, adoravam e ensinavam a presença de Deus vivo no Santíssimo Sacramento, mas na sua conduta não Lhe manifestavam fé e respeito: pois descuidavam-se do palácio, do trono, da tenda, da residência, dos ornamentos, do Rei do Céu e da Terra, isto é, não cuidavam da Igreja, do altar, do tabernáculo, do cálice, do ostensório de Deus vivo e dos vasos, utensílios, ornamentos, vestes para uso e enfeite da casa do Senhor. Tudo estava abandonado e se desfazia em poeira, mofo e imundície de muitos anos; o culto divino era celebrado com pressa e descuido e se não profanado internamente, pelo menos degradado exteriormente. Tudo isso, porém, não era consequência de verdadeira pobreza, mas de indiferença, preguiça, negligência, preocupação com interesses vãos deste mundo, muitas vezes também de egoísmo e morte espiritual, pois vi tal descuido também em Igrejas ricas e abastecidas; vi muitos até, nas quais o luxo mundano e inconveniente e sem gosto substituíra os magníficos e veneráveis monumentos de uma época mais piedosa, para esconder, sob aparências mentirosas e cobrir um disfarce brilhante o descuido, a imundície, a desolação e o desperdício. O que faziam os ricos, por vaidosa ostentação, logo imitaram estupidamente os pobres, por falta de simplicidade. Não pude deixar de pensar nesta ocasião na Igreja do nosso pobre convento, cujo belo altar antigo, esculpido artisticamente em pedra, tinham também coberto com uma construção de madeira e pintura tosca, imitando mármore, o que sempre me fez muita pena.Esta horrorosa visão era tão terrível e hedionda, que meu Esposo celeste me apareceu e, colocando a mão misericordiosa sobre o meu peito, disse: “Ninguém viu isto ainda e o teu coração se despedaçaria de dor, se Eu não o sustentasse”. (fim)Se falasse um ano inteiro, não podia contar todas as afrontas feitas a Jesus e que deste modo conheci. Vi os autores dessas afrontas agredirem a Nosso Senhor com diferentes armas, conforme a espécie de seus pecados. Vi clérigos irreverentes, de todos os séculos, sacerdotes levianos, em pecado, sacrílegos celebrando o Santo Sacrifício e distribuindo a sagrada Eucaristia; vi multidões de comungantes tíbios e indignos. Vi homens numerosos para os quais a fonte de toda a bênção, o Mistério de Deus vivo, se tornara uma palavra de maldição, fórmula de maldição; guerreiros furiosos e servidores do demónio, profanando os vasos sagrados e deitando fora as Hóstias Sagradas ou maltratando-As horrivelmente e até abusando do Sumo Bem, por uma hedionda e diabólica idolatria. Ao lado destes brutais e violentos, vi inúmeras outras impiedades, menos grosseiras, mas do mesmo modo abomináveis. Vi muitas pessoas, seduzidas por mau exemplo e ensino pérfido, perderem a fé na Presença Real de Jesus na Eucaristia e deixarem de adorar nela humildemente seu Salvador. Vi nestas multidões grande número de professores indignos, que se tornaram heresiarcas; lutavam a princípio uns contra os outros e depois uniam-se, para atacar furiosamente a Jesus no Santíssimo Sacramento, na sua Igreja. Vi um grupo numeroso destes heresiarcas negar e insultar o sacerdócio da Igreja, contestar e negar a Presença de Jesus Cristo neste Mistério do Santíssimo Sacramento, negar também ter Ele entregue este Mistério à Igreja e havê-l'O esta guardado fielmente; pela sedução Lhe arrancaram do coração um número imenso de homens, pelos quais tinha derramado o seu sangue. Ai! Era um aspecto horrível: pois vi a Igreja como Corpo de Jesus, que reunira, pela dolorosa Paixão, os membros separados e dispersos; vi todas aquelas comunidades e famílias e todos os seus descendentes, separados da Igreja, serem arrancados, como grandes pedaços de carne, do corpo vivo de Jesus, ferindo e despedaçando-O dolorosamente.
Extraído do livro “VIDA, PAIXÃO E GLORIFICAÇÃO DO CORDEIRO DE DEUS”
Com aprovação eclesiástica!