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MEDITAÇÃO DE SANTA TERESA D’ÁVILA SOBRE A PAIXÃO DE CRISTO


Não vos peço agora que penseis n’Ele, nem que formais muitos conceitos, nem que façais grandes e perfeitas considerações com o vosso entendimento; só vos peço que olheis para Ele. (…) Olhai que Ele, como diz à Esposa[1], não está à espera de outra coisa senão que olhemos para Ele. Encontrá-l’O-eis da forma que quiserdes. Ele quer tanto que volvamos os nossos olhos para Ele, que para isso não poupará nenhuma diligência sua. (…)

Se estais a sofrer ou tristes, vede-O a caminho do Horto. Que angustia não Lhe ia na alma, pois, apesar da sua conformidade com o sofrimento, manifesta-a e queixa-se dela. Vede-O atado à coluna, cheio de dores, com o corpo todo despedaçado por vos amar tanto. Quantos tormentos! Uns perseguiam-n’O; outros cuspiam-Lhe! Negado e abandonado pelos seus amigos, sem ninguém que seja por Ele! Gelado de frio e em total solidão! Olhai-O e, assim, podereis consolar-vos mutuamente. Vede-O com a cruz às costas, que mal O deixavam tomar fôlego. Com Seus olhos tão belos e compassivos, cheios de lágrimas, Ele olhar-vos-á e olvidará as Suas dores para aliviar as vossas, somente para que vos conforteis com Ele e volteis a cabeça para O ver!

Se o vosso coração se enterneceu de O ver assim; se não vos contentais só em olhar para Ele, mas atá gostaríeis de Lhe falar, não com orações feitas mas com a dor do vosso coração – que Ele muitíssimo estima – podeis dizer-Lhe: Ó Senhor do mundo e meu verdadeiro Esposo, se estais tão necessitado, meu Senhor e meu Bem, admiti uma pobre companhia como a minha, pois vejo a consolação do vosso rosto por me ver! Mas como é possível, meu Senhor, que os anjos Vos tenham deixado tão só e nem mesmo o Vosso Pai Vos console? Se é assim, Senhor, que tudo quereis sofrer por mim, o que é isto que agora sofro por Vós? De que me queixo? Até me sinto envergonhada de Vos ter visto assim! Eu quero, Senhor, sofrer todos os trabalhos que me vierem, e tê-los em grande bem por Vos imitar nalguma coisa. Andemos juntos, Senhor; por onde fordes, tenho de ir; por onde passardes, tenho de passar.

Pegai, filhas, naquela cruz, para que não vá tão carregado, e não vos importeis que os judeus vos maltratem. Não façais caso do que vos disserem. Fazei-vos surdas às murmurações. Tropeçando, caindo com o vosso Esposo, não vos separeis da cruz, nem a largueis. Olhai bem o Seu cansaço e vede o quanto maiores são os seus trabalhos em relação aos vossos! Por grandes que os quereis imaginar, e por muito que os quereis sentir, saireis deles consoladas, porque vereis que são uma farsa comparados com os de Senhor.

Direis, irmãs, como é possível fazerem isto, porque, se O tivésseis visto como os olhos do corpo no tempo em que sua Majestade andava no mundo, o teríeis feito de boa vontade e olhado sempre para Ele.

Não acrediteis nisso. Quem não quer fazer agora um bocadinho de esforço para recolher a vista e ficar dentro de si a contemplar este Senhor – podendo fazê-lo sem perigo, bastando só alguma cautela – como poderia ficar ao pé da cruz com Madalena, que via a morte diante dos olhos? Ah, quando deve ter sofrido a gloriosa Virgem Maria e esta santa bendita! Quanta ameaça, quantas palavras más e inconvenientes! Mas que gente tão cortês era essa com quem lidavam! Sim, era gente do inferno, porque eram ministros do demónio. Por certo que devia ter sido terrível o que passaram, porém, diante de uma dor maior, nem sentiriam a sua.

Santa Teresa d’Ávila,

In Caminho de Perfeição, capitulo 26

 

[1] Cant 2, 14

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